domingo, 20 de dezembro de 2015

Metamorfose

Ouça: Jewellery Bx/Cross Eyed Bear - Damien Rice


Depois de meses de ausência, trombaram em um dos cafés que costumavam frequentar aos domingos, depois de compartilhar os corpos e a cama. O dia, fugindo da antiga rotina, era quarta. Ela quase não reconheceu a moça, pois parecia ter mudado por inteiro. A outra sorriu, acenando enquanto soltava uma saudação de um de seus filmes preferidos.

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Don't be a stranger

Já era noite em algum lugar de uma cidade na qual nenhum dos dois pertencia. Em lados opostos, esperavam pelo começo do mesmo espetáculo. Cada qual imerso em seus próprios pensamentos -a rotina, os livros não lidos acumulados nas prateleiras, o trabalho, a falta dele, o futuro e no outro, do lado contrário do salão.

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Não desliga


Pretty soon, I've got to go

But the sooner I leave, the sooner I can come home.
Do you still feel me? Don't disconnect
Go ahead just ask me, all of the questions, left in your head. 
Don't disconnect


Quase comemorava o fato de estar em outra cidade, completamente desconhecida. Cidade que, aliás, sonhara em conhecer meses a fio antes de ser mandada para cobrir um colega em assuntos de trabalho. Encarou a mala pequena e a miudez de um quarto de hotel feito para se passar apenas uma noite – e nada mais – apenas por emergência. Passara três.

quarta-feira, 1 de julho de 2015

(Des)Encontro


Arrumou as malas, tomou as passagens e saiu de casa. Ao chegar na rodoviária, quase
uma hora antes da partida, decidiu colocar as leituras em dia. Nas mãos, carregava Bauman e a liquidez das relações, devorando cada palavra como se fosse a última (ou como se aquilo esclarecesse alguma das inquietações a respeito do próprio relacionamento).

quinta-feira, 21 de maio de 2015

Da falta

Reticências. Silêncio. As confissões compartilhadas em meio às paredes da cidade. A sucessão de idas e vindas em períodos de tempo por vezes demasiado curtos, outros tão longos que arriscavam ponto final.

Aceitavam as falhas do outro, pois, em decorrência das personalidades intempestivas, abraçavam, por consequência, toda a possibilidade de danos.

Já não falam. Preferem não comentar a respeito dos caminhos bifurcados e das perguntas que permaneceram em aberto.

Silêncio. Mais uma vez.

segunda-feira, 11 de maio de 2015

A menina que brincava com fogo

Ouça: Hold No Guns - Death Cab For Cutie

Não era afeita a laços. Dos traços de personalidade e comportamento, aquele que mais a marcava era, sem dúvidas, a facilidade em desatar nós, sumir sem deixar vestígios. Frente à liquidez da própria vida e dos amores que escolhia para si, abrir mão era sempre a solução correta.

sexta-feira, 24 de abril de 2015

Revival

Deverias ter-me escrito novamente,
pois só então e tão de repente,
em direção ao teu caminho, meia volta eu daria.

domingo, 1 de março de 2015

Ventre

Ouça: Múm - Now There's That Fear Again 

 Não fosse pela sequência de horas que me engolem, pelos dias que me apertam o peito, pelas semanas cheias que impedem que grandes pensamentos tomem forma, talvez, não estivesse aqui agora.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

A queda - A implosão

Ouça: Prague - Damien Rice 


Prepare myself for a war
And I don't know what I'm doing this for
Trying to let it all go
But how can I when you still don't know?

Deixem-me tomar parte nesta história. Certa vez, a que voz narra tal novela ouviu em uma esquina a seguinte frase: o primeiro passo daqueles que optam pela ruína é a incomunicabilidade. Espero que entendam que incomunicabilidade, como coloco aqui, nada tem a ver com silêncio, mesmo porque dividir silêncios e dizer muito na ausência de palavras é atividade constante dos amantes que facilmente ruborizam e perdem os sentidos ao lado do outro. Incomunicabilidade, aqui, é trocar frases sem real decodificar seu significado.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

A Queda - O instante anterior

Ouça: Back to Her Man - Damien Rice 




There's a look of war in the way that you go
But the lead in your arrow is loose, don't you know?
And all that you've got is lost in the game
Of picking your own pockets for someone to blame.


Dizem por aí que dor é inevitável, que o sofrimento, esse sim, é opcional. Ainda que figurasse como clichê, senso comum, frase de para-choque de caminhão, nessa situação, era perfeitamente aplicável. Isso porque, de modo silencioso, concordaram por manter: as aparências e o laço, cada vez mais desgastado.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Resposta

Ouça: Have You Seen - Sharon Van Etten


Esbarraram numa das vielas de uma das avenidas alcóolicas mais movimentadas da cidade. Não se viam há tempos e, ainda que no escuro, notavam as mudanças sutis do período que passaram afastadas. Podiam ter seguido cada qual com companhias embriagadas, mas julgaram ser aquele o tempo de pingar os i’s e resolver as pendências. Sentaram no meio fio, mastigando o silêncio encoberto pelo som de vida que saía dos bares.

- Dia desses te vi por aí. Falavas com alguma dessas gurias que arrastam lençóis e correntes na tua vida. Te agarravas no cigarro (já te falei pra largar suicídios lentos!)...
- ...e?
- Não quis interromper. Então cruzei a calçada e segui meu caminho...Veja bem, eu segui meu caminho...