Ouça: Dois Barcos - A Banda Mais Bonita da Cidade
Acabara de chegar ao quarto. A semana, o mês, todos errados. O fato de estar em outra cidade a resolver assuntos de trabalho também não amenizava a sensação de que sua vida era bagunça com a qual não sabia lidar. Tomou o telefone que repousava ao lado da cama, discou os primeiros números que lembrou. Chamou. Duas, três, quatro vezes.
- Eu precisei te ligar...Eu que odeio tanto telefones. Que entro em pânico com o paradoxo da espera por alguém que eu não sei se vai atender, aparecer e gritar do outro lado da linha um “alô?”. Eu...eu tô tão perdida.
"minha estratégia é
que um dia qualquer
não sei como nem sei
com que pretexto
por fim me necessites"
Mario Benedetti in. Tática e Estratégia
Acabara de chegar ao quarto. A semana, o mês, todos errados. O fato de estar em outra cidade a resolver assuntos de trabalho também não amenizava a sensação de que sua vida era bagunça com a qual não sabia lidar. Tomou o telefone que repousava ao lado da cama, discou os primeiros números que lembrou. Chamou. Duas, três, quatro vezes.
- Eu precisei te ligar...Eu que odeio tanto telefones. Que entro em pânico com o paradoxo da espera por alguém que eu não sei se vai atender, aparecer e gritar do outro lado da linha um “alô?”. Eu...eu tô tão perdida.
Quer dizer...eu me perdi. Outra vez. Voei
feito aquele balão que você deixou escapar...lembra? O daquela vez em que fomos
no parque e compraste o teu personagem favorito da infância. Tua
felicidade...um composto de gás hélio e plástico que voou rápido quando tu
decidiste que dava, sim, pra amarrar os cadarços e mantê-lo ali, preso a você. O vento levou tão rápido...o balão, a minha alma,
minhas vontades.
Teu balão foi pra longe. Eu não. Vaguei
por aí. Vendaval. Vento me levando pra primeira bifurcação. Me prendi numa
árvore que surgiu no caminho. E eu tô aqui, entre esses galhos, entre essas
folhas. Tô presa aqui no alto. E, se me perguntares, digo que o mundo é bem
bonito daqui de cima. Apesar das vertigens. Apesar da atração entre meu corpo e
o chão. Eu sei que...
Não sei.
Já não sei de nada. Talvez...talvez queira
dizer que eu fui, mas continuo aqui. Uma parte de mim. No chão. Pra um café, uma tarde, com ombros pra que possas chorar. Etérea. Mais que ontem. Menos que todos os
amanhãs que estão por vir.
Sei lá...as cicatrizes continuam. Permanecem. Só que as incertezas se tornaram firmes. E o cordão está amarrado nessa árvore. Até quando, não sei. Não quero saber das previsões da mesma forma que não peço para que aguarde o nó ser desatado.
Eu preciso ir. Pra lugar algum. Respirar. Então...se ainda restar algo de mim que te caiba, me procura. E...eu acho que é isso. Desculpa.
Antes de desligar percebeu que era ouvida. A resposta do outro lado foi uma respiração pesada. Cansada. Tanto quanto a que acabara de despejar mil informações ao ouvido alheio. Até que começou...
"Eu só queria dizer que..."
Eu só queria dizer, caro leitor, que a frase que se seguiu ficou só.
Só entre os dois.
Antes de desligar percebeu que era ouvida. A resposta do outro lado foi uma respiração pesada. Cansada. Tanto quanto a que acabara de despejar mil informações ao ouvido alheio. Até que começou...
"Eu só queria dizer que..."
Eu só queria dizer, caro leitor, que a frase que se seguiu ficou só.
Só entre os dois.
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