quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Demora

Ouça: A Movie Script Ending - Death Cab For Cutie

Lado a lado, esperavam. Os braços quase se encostavam quando ela, impaciente, se mexia conforme os ônibus chegavam. O primeiro, então o segundo, de companhias diferentes e de procedência igualmente distinta.  Não era aquele que esperava. Outros continuavam a chegar e deixar que seus passageiros desembarcassem. Ela balançava as pernas como se dançasse uma música que só fazia sentido na própria cabeça. O rapaz ao lado observava com o canto do olho. Estava tão ansioso quanto a estranha, mas disfarçava colocando as mãos no bolso frontal da calça enquanto se inclinava para frente e para trás, vez ou outra.



A cena, vista de longe, dava a impressão de que estavam juntos. Eram até meio parecidos. O óculos dele combinava com a cor do cabelo da garota que esperava, não tão pacientemente, ao seu lado. A camiseta dela era do mesmo tom do tênis do cara que a encarava de tempos em tempos. Mas, não. Não partilhavam coisa alguma. Quer dizer, esperavam. O cara pela namorada que viajara para um congresso que acontecia em outro estado. A guria aguardava um amigo com quem, eventualmente, dividia segredos. E a cama.
10, 15, 35 minutos desde que os dois se prostaram lado a lado, aguardando outros alguéns. Cada vez mais impacientes, agora se encaravam, partilhando a mesma frustração de esperar por quem não dá as caras ou sequer manda mensagem, falta grave num mundo onde todos estão conectados a todo o tempo. Começaram, então, a dividir os pensamentos, além do espaço. “Talvez ele não venha...”, “talvez ela tenha perdido o ônibus, sempre acontece”, “se ele não aparecer em cinco minutos, eu saio daqui e nunca mais volto”, “ela sempre faz essas coisas”. A cada pensamento, eles se encaravam, mantendo a conversa muda, mas clara para as duas partes. Até trocaram o famoso sorriso de derrota, abraçando seus fracassos.
Outro ônibus encostara. Como se coreografado, o corpo de ambos tomara a mesma direção, fazendo com que encostassem um no outro. Pediram desculpas, manteram a distância que prevalecia anteriormente e aguardaram até que a última pessoa saísse. Nada. Aquela era a última esperança. Deram meia volta e cada um seguiu seu caminho, as cabeças baixas e os ombros frouxos.

(***)

Cruzaram-se mais tarde em um bar. Os olhares se cruzaram e a conversa, antes muda, tomara forma. Contaram o que faziam na rodoviária e riram ao perceber que, de fato, compartilhavam a mesma situação.

Lado a lado, esperavam. Não por aqueles que não iriam chegar. 
Só pela coincidência que os levaria a um novo começo.

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