Ouça: Make-Up Smeared Eyes - Automatic Loveletter
Era
abril. Naquela tarde eu não senti nada. Nada além de uma vontade, dessas
enormes, de te expulsar de vez de mim. E eu não falo das inúmeras tentativas de
ignorar tuas chamadas, tuas mensagens, tuas desculpas esfarrapadas. Eu queria
te arrancar da minha pele só pra poder aprender a viver sem todo o peso de uma
vida com teu fantasma. Te amei, sabe. Com todo teu mau humor, tuas desculpas, mentiras, atrasos.
Te amei entre distâncias e deixei que conhecesse todos os espaços que havia em
mim.
Peço
espaço para que meu ódio se vá e eu te ame agora. Para que eu encontre um
canto na minha vida quase nova, nos espaços que se tornaram inteiros, em que
você se encaixe. Eu não quero saber nada daquilo que nunca entendi: não quero
saber do teu amor, do teu riso, do teu humor, das tuas vontades, das tuas
provocações. Eu quero me afundar na tua sombra.
Só por hoje. Só hoje eu me liberto da enorme vontade de fazer tua vida
em três mil pedaços. Eu deixo passar minha mania de buscar tua (in)existência em um
lugar que você nunca pisou. Deixo de lado tudo isso até que essa música e
minhas palavras acabem. Vou te amar agora, mais uma vez, como se nunca tivesse
deixado de fazer isso.
Nunca
soube o que fazer contigo e com essa tua (in)existência simples demais. As
banalidades nunca foram suficientes, o desejo nunca foi o bastante e tive de
procurar razões pra explicar o que eram os dinossauros, sempre pesados demais,
dançando no meu estômago. E quando eles se calavam, você me silenciava e
implorava por menos sentimentos. Esse emaranhado de mistérios e vontades nunca
foi suficiente pra me preencher, nunca me disse nada. Éramos sem fim, sem
começo, sem meio, despidos de explicações que justificassem todas as portas
batidas e a insistência em inúmeras segundas chances.
Não
sinto saudade do teu amor. Não é possível dar falta daquilo que nunca se
concretizou. Ele ficou ali jogado na sua infindável pilha de planos e eu nunca
soube qual gosto ou cheiro ele teria. Sinto falta mesmo é das palpitações do
meu coração metido a profundo. Eu só queria tua face desenhada na minha
memória, tocar cada pedaço da tua (in)existência e calar essa estupidez que me
fazia sentir pequena demais. Faz falta congelar com cada palavra meio ríspida,
com a sensação de ser invadida por algo que eu nunca quis e que jamais soube
controlar. Eu te amava porque assim o mundo era mais intenso e não por sua
causa.
Sinto
falta da raiva a cada vez que eu ia embora batendo portas, jurando nunca mais
voltar. Falta de sentir tua (in)existência por debaixo da minha pele como ninguém nunca mais conseguiu entrar. Falta do teu desprezo em me fazer feliz. Falta das tuas distâncias que
me deixavam admirando o vazio por horas até que me desse conta de que não
estavas ali. Falta da tua incapacidade de me prender por mais que 15 minutos.
Era você. Sem poesia, sem paciência, sem dores, desprovido de alma para
suportar o que poderia ter sido "nós".
Jurei
a mim mesma não mais tentar entender essa incógnita que era você e apenas
sentir a falta da tua (in)existência, do teu desprezo, das minhas exigências e
toda a intensidade. Sinto falta. Falta, principalmente, do abismo que era amar
a última pessoa que amaria.
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