domingo, 11 de agosto de 2013

Abismo

Ouça: Make-Up Smeared Eyes - Automatic Loveletter
                

                Era abril. Naquela tarde eu não senti nada. Nada além de uma vontade, dessas enormes, de te expulsar de vez de mim. E eu não falo das inúmeras tentativas de ignorar tuas chamadas, tuas mensagens, tuas desculpas esfarrapadas. Eu queria te arrancar da minha pele só pra poder aprender a viver sem todo o peso de uma vida com teu fantasma. Te amei, sabe. Com todo teu mau humor, tuas desculpas, mentiras, atrasos. Te amei entre distâncias e deixei que conhecesse todos os espaços que havia em mim.
               Peço espaço para que meu ódio se vá e eu te ame agora. Para que eu encontre um canto na minha vida quase nova, nos espaços que se tornaram inteiros, em que você se encaixe. Eu não quero saber nada daquilo que nunca entendi: não quero saber do teu amor, do teu riso, do teu humor, das tuas vontades, das tuas provocações. Eu quero me afundar na tua sombra.  Só por hoje. Só hoje eu me liberto da enorme vontade de fazer tua vida em três mil pedaços. Eu deixo passar minha mania de buscar tua (in)existência em um lugar que você nunca pisou. Deixo de lado tudo isso até que essa música e minhas palavras acabem. Vou te amar agora, mais uma vez, como se nunca tivesse deixado de fazer isso.
                Nunca soube o que fazer contigo e com essa tua (in)existência simples demais. As banalidades nunca foram suficientes, o desejo nunca foi o bastante e tive de procurar razões pra explicar o que eram os dinossauros, sempre pesados demais, dançando no meu estômago. E quando eles se calavam, você me silenciava e implorava por menos sentimentos. Esse emaranhado de mistérios e vontades nunca foi suficiente pra me preencher, nunca me disse nada. Éramos sem fim, sem começo, sem meio, despidos de explicações que justificassem todas as portas batidas e a insistência em inúmeras segundas chances. 
                Não sinto saudade do teu amor. Não é possível dar falta daquilo que nunca se concretizou. Ele ficou ali jogado na sua infindável pilha de planos e eu nunca soube qual gosto ou cheiro ele teria. Sinto falta mesmo é das palpitações do meu coração metido a profundo. Eu só queria tua face desenhada na minha memória, tocar cada pedaço da tua (in)existência e calar essa estupidez que me fazia sentir pequena demais. Faz falta congelar com cada palavra meio ríspida, com a sensação de ser invadida por algo que eu nunca quis e que jamais soube controlar. Eu te amava porque assim o mundo era mais intenso e não por sua causa.
                Sinto falta da raiva a cada vez que eu ia embora batendo portas, jurando nunca mais voltar. Falta de sentir tua (in)existência por debaixo da minha pele como ninguém nunca mais conseguiu entrar. Falta do teu desprezo em me fazer feliz. Falta das tuas distâncias que me deixavam admirando o vazio por horas até que me desse conta de que não estavas ali. Falta da tua incapacidade de me prender por mais que 15 minutos. Era você. Sem poesia, sem paciência, sem dores, desprovido de alma para suportar o que poderia ter sido "nós".

                Jurei a mim mesma não mais tentar entender essa incógnita que era você e apenas sentir a falta da tua (in)existência, do teu desprezo, das minhas exigências e toda a intensidade. Sinto falta. Falta, principalmente, do abismo que era amar a última pessoa que amaria.

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