segunda-feira, 8 de julho de 2013

Os Outros

Ouça: Golden Baby - Coeur de Pirate
         Começou quando ela entrou na sala. A garota de cabelos negros sentou ao lado da carteira do garoto com fones de ouvido, enquanto ele não fez nada mais que dar uma olhada de lado pra estranha. Estranha, sim. Veja bem, apesar daquele colégio ser um dos que há nas metrópoles, aquela era uma cidade pequena. O cabelo desfiado, a bolsa azul ao invés da mochila de lona, a franja a esconder o olhar tímido...tudo isso chamava a atenção. Não só dele, diga-se de passagem: aquela era a sala do Ensino Médio de uma Universidade Tecnológica de algum lugar. O curso era Informática Industrial e, bem, vocês sabem, algumas garotas estão interessadas em moda e coisas do tipo, não em como computadores funcionam e qual é a possibilidade de uso deles. Vejam bem, eu disse algumas. E aquela, ele descobriu após o "oi" que trocaram minutos antes do professor entrar na sala, não era uma delas. Foi assim por muito tempo, até que acontec...
         Naquele ano, tornaram-se melhores amigos. Ele contava sobre o filme que viu antes de dormir, ela o chamava pra todas as festas da cidade. Chamava também o grupo de amigos da sala, afinal, ali todos se conheciam e se entendiam bem, caso raro. Ela também convidava o namorado, que sempre vinha com alguma desculpa esfarrapada do tipo: "não conheço ninguém", "tenho que cuidar do meu primo", "estou gripado". O rapaz era dois anos mais velho e morava na cidade vizinha, cerca de trinta minutos de distância. A garota não entendia muito bem as desculpas, até que descobriu que o motivo pelo qual o namorado evitava as festas não era uma gripe ou um primo para cuidar: eram duas ou três garotas de nome, sobrenome e vestidos curtos. Isso foi, mais ou menos, quando o segundo ano do médio começou.
         Ele estava lá quando ela tentava procurar as respostas para a imaturidade do ex. Ela ouviu, com certa birra, quando ele disse que conheceu uma garota linda no fórum daquele jogo que ela nunca teve paciência pra conhecer. Ele ajudou a cicatrizar aquela ferida e acalmou os medos dela. Ela acabou descobrindo que ele podia ser tão bom amante quanto era como melhor amigo. Os dois assumiram o namoro mais ou menos na metade do ano, mas todos já sabiam. Diziam que os dois se completavam, que aquilo era destino e que ter "acertado" assim, tão cedo, só poderia ser coisa boa.
         Já no início do ano seguinte, ele decidiu que continuaria com os computadores. Ela decidiu que iria contar a história de outras pessoas e, para isso, precisaria conhecer o mundo. Ele nunca entendeu muito bem essa vontade dela de ser maior, mas apoiou, talvez por pensar que ela mudaria de ideia. Isso nunca aconteceu. Ao logo daquele ano, ela viajou várias vezes pra uma cidade dez vezes maior do que aquela em que os dois se conheceram e decidiu que, sim, era aquilo que queria. Ela sempre poderia voltar para casa nos feriados. Os dois poderiam morar juntos, mais tarde. Assim, depois de muitas conversas ao telefone conforme empacotava o que levaria, ela partiu. Sete e meia de 9 de Janeiro de um desses anos quaisquer.
         Três meses se passaram e os encontros, antes diários, diluíram-se em 3 visitas rápidas. O perfume dela nas roupas continuava o mesmo, mas ele não sabia que o modo como ela se vestia havia mudado. A risada dele ainda continuava sendo o melhor som do mundo, mas as piadas agora não eram tão bobas e divertidas quanto antes. Decidiram que o melhor seria que cada um escolhesse seus caminhos. Isso há uns dois anos atrás.
         Ele passou na faculdade da cidade ao lado. Foi morar com alguns amigos numa espécie de república. Conheceu algumas garotas, nenhuma como aquela. Ela foi viajar. Conheceu um pouco do mundo, das pessoas e alguns caras. Escreveu histórias sobre eles, sobre ela, sobre as amigas e o que mais lhe viesse à mente. Ela voltava pra casa mais ou menos quando ele estava de férias e fazia o mesmo. Encontravam-se assim, como quem não sabe nada sobre o outro, mas espera trombar com ele na esquina mais próxima.
E, mais uma vez, partiam. Partiam com a mesma indagação de sempre: "o que havia acontecido?" Procuravam respostas em palavras chave como "distância", "medo", "mundo", "tudo" e muitas outros. Esqueceram só uma, caro leitor. Eis o que aconteceu a estes dois: a vida. 

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