Ouça: We Are Nowhere and It's Now - Bright Eyes
"... ... ... Oi! Hã...desculpa... Quem está falando... bem... quer dizer...
sendo sincero, você está falando com a secretária eletrônica! Liga mais tarde
ou...ah, deixa um recado."
Desliguei.
"... ... ... Oi! Hã...desculpa... Quem está falando... bem... quer dizer...
sendo sincero, você está falando com a secretária eletrônica! Liga mais tarde
ou...ah, deixa um recado."
Ahn, oi! Ou seria boa noite? Eu só tô te
ligando porque...eu não sei. A casa está vazia, todos que podiam me ouvir estão
fora...e tem você. Aí, do outro lado. Onde eu não te vejo, não te alcanço...e
isso é patético. Eu não preciso de você. Justo eu, que sempre dei pra me pintar
de individualista e neuroticamente independente! Eu...não preciso...de você. E,
ainda assim, te ligo. Eu não preciso, mas queria. Só...esquece. -pausa, ela
respira, procura o que falar- Só quero conversar. Sei lá, aceitar teu convite e
conversar. É que...-dessa vez, ela ri, como se tivesse ouvido uma piada há
muito tempo e só tivesse sido capaz de captar o sentido agora-Eu jurava que
você odiava telefones...aí você grava essa mensagem e eu fico aqui, sem
entender. E eu odeio não entender as coisas. Me faz patética, mais uma vez.
-...- Sabe, eu fui à biblioteca ontem, como costumo fazer toda semana. Passeei
pelos corredores, sem saber muito o que queria. Achei os livros do Chico
Buarque, peguei um, olhei a capa e decidi que levaria comigo ao mezanino, tinha
ainda algum tempo pra matar. Então eu vi esse outro livro, verde limão. O livro,
apesar de ter uma cor chamativa, não saltava aos olhos. Li então o nome na lombada, alguma
coisa com dores e amor. Na capa, nenhuma informação. Levei os dois. Folheei o
desconhecido e descobri do que se tratava. A autora é uma dessas que escreve
pra tevê, provavelmente você não gosta. Quem sabe, só não dá a mínima. Aquela
mulher já tinha escrito tanto da minha vida, tinha dado luz à mulheres
neuróticas que tinham um pouco de mim e muito dela. E o livro estava ali, perto
do Chico, no corredor B8...alguma coisa. Fora de lugar... Eram poemas, sabe? Em um deles ela
jurava que sofreria quieta. Em outro, dizia que, quando um amor terminava,
sentia vontade de desenterrar outros mil, já acabados...Achei graça, mas
acredito que todos temos um pouco disso, de querer voltar atrás, consertar o
erro. Dizer que tudo-bem, que eu-mudei-eu-juro, que tá-tudo-bem...Mas o que me
doeu foi aquele dedicado a alguém cujas iniciais eram A.M. A autora escreveu
algo como: "Você gosta de mim. Mas não tanto. Não o suficiente para perder
a sua juventude estúpida-toda juventude a é- com uma menina de 16 anos de olhos
tristes." E...Não é suficiente, certo? Nunca é...E aquilo foi como uma
bofetada...dessas bem grandes... Na continuação, ela falava que, por não ter
sido suficiente, ele não foi capaz de protegê-la, nem dela mesma, menos ainda
dos outros. A moça se perdeu por aí, bem mais do que eu me perco todos os
dias...E, cansei, sabe? De me achar pra me perder e tornar ao ciclo, dez...onze
vezes. Então quis te ligar só...só pra dizer que...hm...que eu tô indo, tá?
Indo pra casa, indo pra rua, indo embora...mas eu tô indo, que é por não
aguentar esperar. Se quiser, me liga quando ouvir...e te cuida. Vai, rapaz, não me
odeia...vai ver, tem de ser como eu sempre disse: uma hora a gente se encontra.
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