Ouça: Sweet Nothing (Cover) - Leo Stannard
"Quando você ler essas palavras, já estarei longe. Provavelmente, na metade dos inúmeros quilômetros que nos separam. Não, não tenta me ligar agora. Apenas leia minhas minhas palavras mal distribuídas e vê se entende. Tenta.
Pensei em escrever algo grandioso, que mudasse teu mundo e me fizesse sentir meio boba. Amasso o papel e jogo-o à pilha dos fracassos. Acontece que eu fui embora. Outra vez. Sem olhar para trás, de mãos vazias e mais leve que esse vento que acaricia a tua pele nos fins de tarde. Está me ouvindo? Eu parti e, dessa vez, eu jurei não voltar. Sei que já lhe disse isso dezenas de vezes e sempre acabo retornando. Não dessa vez.
Como eu já disse, fui embora. Não posso ficar solta, amor. Meu coração é intempestivo, tolo e dono de um amor ferido, arredio. Precisa de disciplina, palavra de ordem. Ou veste os sapatos e sai por aí a destruir o que encontrar pela frente. Seja você, eu ou o rapaz bonito que mora no apartamento ao lado do seu. E, dessa vez, meu coração colocou o sapato mais alto, o decote mais abusado e decidiu sangrar pelas noites de uma capital inconstante. Não, não faltou carinho, cuidado, paixão, risadas ao vento e ligações no meio da noite. Mas a insegurança bateu à porta e exigiu garantias. Caí na lábia dessa tal e fui embora de você antes mesmo de fazer minhas malas e tomar o primeiro ônibus para casa.
Sexta-feira do último mês, um bar qualquer no canto de uma cidade universitária, música alta e seus novos amigos. O gelo derretia em meu copo, mas parecia ficar cada vez mais sólido no meu peito. Você contava alguma história sobre alguém que bebeu demais na última festa das turmas de exatas enquanto eu admirava teu modo de falar. Sabes muito bem do quanto eu gosto de assistir teu esforço em se lembrar de todo e cada detalhe, por mais supérfluo que seja. Meus dedos escorriam por seu cabelo, descendo, vez ou outra, pela nuca e eu tinha vontade de lhe tirar dali. Engoli minha timidez, o resto de bebida quente que ainda havia em meu copo, algumas doses de tequila e vomitei indiferença. A pista de dança chamou meu nome e eu dancei como se não houvesse amanhã. Voltamos para o seu apartamento, cada um com sua bagagem adquirida na noite: você, com sua cara amarrada e eu, com alguns números de desconhecidos no celular. Apesar de tudo, acordei com teu olhar de preocupação e a xícara teu melhor café pra curar minha ressaca. É uma pena que tu não saibas que ressaca moral não passa tão fácil.
Uma semana mais tarde, sem perceber, abristes as mãos e deixastes que eu escorresse pelos teus dedos feito areia. No meio de uma conversa com algum colega teu, percebi que não havia espaço pra mim e sufoquei. Fiquei caladinha, quieta, ensimesmada. Como sempre faço. É claro que meu olhar perdido capturou tua atenção e fez com que perguntasse o que havia de errado. Silêncio. Pensei em te falar como essa sucessão de desencontros me destrói ou de como eu não estou acostumada com o caos que se encontra dentro de mim. Calei. Você não entenderia como o nó da minha garganta estava apertado e nem as lágrimas torrenciais que viriam após a tentativa frustrada de explicação. Expôr meus medos assim, de bandeja, nunca esteve nos meus planos. Mas, convenhamos, você também nunca foi um deles e, veja só, a que ponto chegamos. O "nada" sussurrado, tão típico em filmes dramáticos, foi a única resposta que pude dar. Você disse alguma coisa boba e eu dei meu melhor sorriso em retorno. Minha atuação foi convincente e eu poderia ter ganhado o Oscar naquele momento.
Sei que agora você me odeia. É sempre assim. Já disse "adeus" suficientes para uma vida. Queria não ter que dizer isso outra vez, não para você. Mas, é que no embalo da tua indecisão, peguei carona no bloco que passava na rua e fui dançar em outros carnavais. Não adianta cantar teu bolero, amor. Certas coisas cansam, indefinição é uma delas. Vê se decide o que quer ou procura alguém que queira se vestir de farsa, porque essa fantasia já não cabe no meu corpo. Então vai, pode maldizer meu nome nessas noites frias. Eu estou de partida.
Tens meu endereço, telefone e, ainda, o coração. Quando descobrir do que precisa, me procura.
Te cuida, rapaz.
Adeus."
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