terça-feira, 23 de janeiro de 2024

estranha

aos quase 28 percebo que perdi o vocabulário rebuscado e parece até que algumas palavras me fogem da cabeça ao tentar descrever situações cotidianas. minha língua deixou de ser ácida e movida por jogos.

me despi das maldades e dos muros que achei por bem construir no início da vida adulta. escrevo menos, falo mais. questiono os laços que se construíram até aqui com aqueles que me desejaram, mas não bancaram a minha presença. lembro que eles eram jovens, claro, só que menos que eu. rio, porque, apesar dos desencontros, a vida parecia menos com uma série de burocracias e reuniões que podiam ser um e-mail e mais com os filmes que assistia. sinto minha linguagem ficando dura e os ouvidos precisando de clareza. penso menos nos finais felizes e nos grandes gestos. entendi que acordos bem definidos funcionam melhor e me trazem menos angústias. menos prepotente, ainda com a sensação de ser uma ótima atriz e interpretar o papel da minha vida, esperando que alguém desmascare o personagem e a revelação nunca vem.

os choros são agendados. cabem num deslocamento, num banho, num momento sozinha. às vezes sinto transbordar no meio de um texto que é todo persuasão e nenhum sentimento. sozinha. é isso que sinto, às vezes. entendo hoje quem são os meus, lamento por não conseguir entregar mais a eles quando já falta tanto de mim. me isolo um pouco, saio para caminhar e esqueço de responder. eu já falei que esqueci o que é maldade? 

algumas semanas atrás achei que estava louca. era estafa. de pensar, de bancar recomeços, mesmo que metafóricos. pensar no futuro dói e eu não achei que chegaria até aqui. tem sido uma surpresa. 

lembro daquela de recém 21 anos, malas prontas e um encontro traumático na trajano reis quando volto a encontrar a mesma companhia num festival em outro estado. ela merecia mais, ele também. lembro ainda daquela que se recompunha aos vinte e o escritor que nunca saíram dos rascunhos. e depois um e outro emocionado pelo caminho. penso hoje que pela ausência e de cada desenrolar. lembro que os cortes abruptos me fizeram sentir menos humana, quase que totalmente um objeto romântico-sexual, de modo que importava para eles tão pouco quem eu era e a pessoa que eu me tornei. acho que é assim que eles justificaram os afastamentos. pareço ser isso agora, quando ainda me observam à distância com seus ressentimentos enquanto eu não posso expressar os meus.

life goes easy on me, most of the time. o que é amor e o que flui permanece comigo. apesar do que passou, apesar de mim. 


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