Ouça: Watch How You Go - Keane
Acordei. Cinco e cinquenta três da manhã, sexta feira de um mês qualquer, uma capital inconstante e teus abraços ao redor da minha cintura. Nem sabes, mas fiquei ali, por uns bons minutos lhe encarando, vendo o cenho que franzia conforme os sonhos mudavam. Queria ficar até que seu sono se esgotasse, só pra perguntar o que é que te incomodava tanto enquanto dormias. Ao invés disso, desvencilhei-me dos teus braços e segui em direção ao banheiro.
*Esse texto é uma versão alternativa de "Fugitivo", publicado por Eduardo Giovanni, no blog Contos avulsos. Para ler a versão original, clique aqui.
*"A falta que nos move" é título de um filme brasileiro. Para mais informações, clique aqui.
Acordei. Cinco e cinquenta três da manhã, sexta feira de um mês qualquer, uma capital inconstante e teus abraços ao redor da minha cintura. Nem sabes, mas fiquei ali, por uns bons minutos lhe encarando, vendo o cenho que franzia conforme os sonhos mudavam. Queria ficar até que seu sono se esgotasse, só pra perguntar o que é que te incomodava tanto enquanto dormias. Ao invés disso, desvencilhei-me dos teus braços e segui em direção ao banheiro.
Sem que me desse conta, tu me encaravas com olhos nublados, perdidos. De modo que, quando, sem nada dizer, me
tomaste com um abraço, logo achei estranho. Pousaste a cabeça em meu ombro e
permanecera ali, por algum tempo. Quis lhe perguntar o que havia acontecido,
talvez fosse só um sonho ruim. Você sabe, eu estava ali.
Tinhas meu colo, meu abraço e uma palavra ou outra, cuidadosamente calculada pra apartar sua dor. Deixaste o cômodo do mesmo modo que há pouco tempo o adentrara: calado.
Tinhas meu colo, meu abraço e uma palavra ou outra, cuidadosamente calculada pra apartar sua dor. Deixaste o cômodo do mesmo modo que há pouco tempo o adentrara: calado.
Assim que cheguei ao quarto, tu
havias descido. Na cama desarrumada, joguei as roupas que usaria. A cômoda ao
teu lado encontrava-se limpa. Sem os habituais discos que ali tu deixavas, sem
o copo d’água, sem os desenhos que, vez ou outra, deixavam a pilha caótica e encontravam o chão. Dei de
ombros, talvez você havia decidido ser mais organizado. Vestida, busquei
aqueles sapatos com que você sempre implicara. Armários, banheiro, escritório e
embaixo da cama. Lá, ao lado dos fugitivos, encontrei sua mala. Talvez o plano
de ser mais organizado incluísse trocar objetos de lugar de forma aleatória.
Podia ser isso, não? Resgatei os resquícios de ingenuidade que ainda possuía
pra me convencer de que você não iria partir, não dessa forma.
Na cozinha, busquei, num beijo
roubado, saber o que te incomodava. Provavelmente o amargo do café havia
mascarado aquilo que eu buscava conhecer. Teu riso frouxo dissipou, por breves
segundos, minhas perturbações. O tic tac de um relógio começou a pesar em meu peito
enquanto desjejuávamos um misto de silêncio e angústia. Foi ali que eu soube que
nenhum dos dois vomitaria as palavras que o outro precisaria ouvir.
Antes de sair, teus braços me
acolheram e meus lábios encontraram os teus. Lábios estes embebidos no amargo significado de "despedida". Eu, que sempre parti antes que as coisas ficassem complicadas, agora
entendia como era ser deixada para trás. Saí por aquela porta sabendo que não nos
veríamos. Por um dia, um mês, uma hora, uma vida, quem sabe. Como costumávamos cantar: somos tão jovens.
Dizíamos que as pessoas eram como planetas, lembra? Divagações interplanetárias, conversas sem sentido e todos os
mistérios envolvendo o universo. Nunca decidimos a qual pertencíamos. Talvez
fôssemos apenas planetoides que se alinharam por mero acaso, numa dessas
ocasiões que acontecem uma vez no século e duram poucos segundos. Partimos um
do outro há tempos, meu bem. Liga não, talvez a gente se cruze numa dessas ruas, num dos shows de uma banda qualquer, em uma livraria cara de um bairro afastado do centro da cidade. Carrega contigo teus motivos. Rápido! Vai! Toma teu tempo. Aqui, calada, bebo, aos poucos, tua falta. Deixa as cartas, os telefonemas pra depois, segue teu caminho, o mundo lá fora é grande, você sabe... Ah, deixa pra lá essas divagações, só faz o seguinte: te cuida.
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